Dois
homens sentaram-se num banco. Caía uma fina chuva sobre a cidade e o sol que
nascia por detrás das nuvens pintava de rosa o céu nublado. Carregavam consigo
malas, pois era uma despedida. Um deles, barbado, carregava dois copos de café
para beberem enquanto esperavam o primeiro trem partir. Não conversavam entre
si.
Como
praxe, o homem barbado acendeu um cigarro. O outro não fazia questão de fumar;
não ali. E passaram-se longos minutos. Era palpável a tensão entre ambos, como
poeira presente no ar. O segundo homem, moreno, continuava a beber seu café de
modo solene. Ignorava a presença do outro e só pegou o café quando o viu sobre
o banco.
— Que horas o trem parte? — perguntou o barbado. Não houve resposta.
Abaixou-se e fuçou a bagagem.
No bolso externo da mala, encontrou a passagem. Na verdade, sabia perfeitamente
o horário da partida, mas o silêncio o angustiava. Ele não irá falar. Era
perceptível em seu olhar, escuro e opaco, a relutância àquele momento. Preferia
ter vindo sozinho, sem dizer adeus. Já bastava, contudo, que fosse uma
despedida abrupta.
Era madrugada e chovia. Não
conseguia dormir e, portanto, foi para a sala fumar. Encontrou um vinho suave
barato, completou uma taça e abriu as grandes janelas do lugar. As cortinas
esvoaçaram. O outro dormia tranquilo no quarto, as malas já prontas. Ele ainda
remoía a conversa do jantar.
— Estou de partida — anunciou enquanto comiam spaguetti e almôndegas
— Amanhã, de manhã.
Não houve resposta. Sentiu-se
humilhado e raivoso. Parou por uns instantes, a cabeça inclinada para frente.
Quando falou, sua voz não era mais do que uma fraca rouquidão.
— Quando você decidiu ir embora?
— Agora — mentiu — Não há mais sentido continuarmos a viver assim,
você sabe.
— Assim, abruptamente?
— Sim.
Quando
deu conta de si, a chuva molhava o piso da sala, carregada pelo vento. Ficou de
frente para a janela, molhando o rosto com os pingos gelados. Tocavam sua pele,
eriçando os pelos como as palavras que havia ouvido. Fechou a janela após
derramar o que restava do vinho por ela. Apagou o cigarro num cinzeiro.
Deitou-se no sofá. E chorou. De raiva. De tristeza. De amargura.
— Acho melhor ir — disse, finalizando o cigarro. O outro assentiu com
a cabeça. — Dê-me um abraço de despedida.
Não houve resposta. Fitou-o
quieto, levantou-se e seguiu seu caminho. Por um instante, pelo canto dos olhos,
vislumbrou um movimento, entretanto, não se deteve e continuou caminhando em
direção a saída. A chuva caía forte e o céu estava rancoroso. Atravessou a
ruela do estacionamento correndo e entrou em seu carro. Estava frio, muito
frio. Acendeu um cigarro e observou-o dali, a poucos metros atrás da enorme
parede de vidro. Continuava intransigente, sentado ereto. Besteira, não havia
se movido. E então reparou em algo sobre o painel. Um papel dobrado.
Segurou-o em sua mão trêmula.
Segurou-o por um longo tempo, fitando-o com seu olhar afiado. Segurou-o em
dúvida. Hesitou. Por fim suspirou. Estava cansado e inclinou a cabeça. Era seu
momento solene, sua despedida, a despedida que o outro lhe havia declinado. Abriu
a janela, amassou o papel e jogou-o fora.
— Adeus.
Ligou o carro e partiu. Não
olhou para o lado nem pelo retrovisor. Longo é o caminho para casa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário